terça-feira, dezembro 03, 2019

"Meus poemas sofrem de mim"

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Estado - Poemas são assim tão perigosos? Os seus costumam ser adotados nas provas de vestibular. Você não gosta. Por quê?
Manoel - Faço uma poesia difícil. Depois, cair no mundo das imagens não é para qualquer um. Ainda mais para adolescentes. Adolescentes querem as coisas retas, senão não aceitam. E minha poesia é torta.

Estado - Eles exigem, no mínimo, professores muito preparados.
Manoel - Mas nem os professores me digerem. Há pouco tempo, chegou aqui em casa uma das coordenadoras do vestibular em Mato Grosso. Ela me disse: "Eu não entendo nada de seus livros. Se me permitir dizer a verdade, eu vou dizer: seus livros são uma m...!"

Estado - E como você reagiu?
Manoel - Eu lhe disse: "Olhe, minha querida, se meus poemas são difíceis, a culpa não é minha. Juro que não tenho culpa. Meus poemas sofrem de mim."

Estado - E então?
Manoel - Ela estava desesperada. E me disse: "Pois é, mas eu não entendo nada. Como é que vou preparar meus alunos para as provas?" Eu respondi: "Olhe, eu também não sei o que lhe dizer. Meus livros não são para vestibular." Poesia exige sensibilidade. Se você não tem sensibilidade, preparo algum adianta.


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Entrevista a José Castello para o Estado.

Um comentário:

Graça Pires disse...

Gostei muito desta entrevista com Manoel de Barros. Poesia é realmente para quem tem sensibilidade. Não se aprende, sente-se…
Um grande beijo, minha Amiga Solange.