terça-feira, janeiro 19, 2021

O lápis

 


É por demais de grande a natureza de Deus.

Eu queria fazer para mim uma naturezinha particular.
Tão pequena que coubesse na ponta do meu lápis.
Fosse ela, quem me dera, só do tamanho do meu quintal.
No quintal ia nascer um pé de tamarino apenas para uso dos passarinhos.
E que as manhãs elaborassem outras aves para compor o azul do céu.
E se não fosse pedir demais eu queria que no fundo corresse um rio.
Na verdade na verdade a coisa mais importante que eu desejava era o rio.
No rio eu e a nossa turma, a gente iria todo 
dia jogar cangapé nas águas correntes.
Essa, eu penso, é que seria a minha naturezinha particular:
Até onde o meu pequeno lápis poderia alcançar.


Poemas rupestres. Pág. 439 e 440 da minha edição. 
Poesia completa - São Paulo: Leya, 2010.

 

 

2 comentários:

Graça Pires disse...

Eu também queria isto tudo, e também "Eu queria fazer para mim uma naturezinha particular.
Tão pequena que coubesse na ponta do meu lápis." É que escrevo a lápis e talvez a minha inspiração fosse maior...
Obrigada, minha Amiga Solange por nos trazeres o Manoel de Barros.
Cuida-te muito bem.
Uma boa semana.
Um beijo.

SILO LÍRICO - Poemas, Contos, Crônicas e outros textos literários. disse...

Poemas concebidos sem pecado
E o lápis teu que nos conta
A natureza da ponta
Deixam-me extasiado.
Se o belo existe de um lado
Do outro existe o mistério
Desse teu pequeno império
Concebido. É poesia
Que a tua alma cria
Sem que tu a leves a sério!

Belo espaço! Estou a seguir e voltarei! Abraço fraterno. Laerte.