sábado, julho 01, 2017

Aprendimentos


O filósofo Kierkegaard me ensinou que cultura 
é o caminho que o homem percorre para se conhecer. 
Sócrates fez o seu caminho de cultura e ao fim 
falou que só sabia que não sabia de nada.
Não tinha as certezas científicas. Mas que aprendera coisas 
di-menor com a natureza. Aprendeu que as folhas 
das árvores servem para nos ensinar a cair sem 
alardes.
Disse que fosse ele caracol vegetado 
sobre pedras, ele iria gostar. Iria certamente 
aprender o idioma que as rãs falam com as águas 
e ia conversar com as rãs.
E gostasse mais de ensinar que a exuberância maior está nos insetos 
do que nas paisagens. Seu rosto tinha um lado de 
ave. Por isso ele podia conhecer todos os pássaros 
do mundo pelo coração de seus cantos. Estudara 
nos livros demais. Porém aprendia melhor no ver, 
no ouvir, no pegar, no provar e no cheirar
.
Chegou por vezes de alcançar o sotaque das origens. 
Se admirava de como um grilo sozinho, um só pequeno 
grilo, podia desmontar os silêncios de uma noite! 
Eu vivi antigamente com Sócrates, Platão, Aristóteles — 
esse pessoal
.
Eles falavam nas aulas: Quem se aproxima das origens se renova. 
Píndaro falava pra mim que usava todos os fósseis linguísticos que 
achava para renovar sua poesia
. Os mestres pregavam 
que o fascínio poético vem das raízes da fala.
Sócrates falava que as expressões mais eróticas 
são donzelas
. E que a Beleza se explica melhor 
por não haver razão nenhuma nela. O que mais eu sei 
sobre Sócrates é que ele viveu uma ascese de mosca.

Um comentário:

Graça Pires disse...

"Aprendimentos" de Manoel de Barros...
Um beijo, querida amiga.