quarta-feira, abril 12, 2017

Sobre a fragmentação da realidade

Imageem: Picasso
A minha poesia é cada vez mais fragmentada porque as palavras me acham assim: cada vez mais fragmentado. Penso que os meus conflitos cresceram tanto dentro de mim a ponto que me fizeram pedaços. Sou hoje pedaços de mim.

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(...)”Li em Chestov que a partir de Dostoievsky os escritores começam a luta por destruir a realidade. Agora a nossa realidade se desmorona. Despencam-se deuses, valores, paredes... Estamos entre ruínas. A nós, poetas destes tempos, cabe falar dos morcegos que voam por dentro dessas ruínas. Dos restos humanos fazendo discursos sozinhos nas ruas. A nós cabe falar do lixo sobrado e dos rios podres que correm por dentro de nós e das casas. Aos poetas do futuro caberá a reconstrução - se houver reconstrução. Porém a nós, a nós, sem dúvida - resta falar dos fragmentos, do homem fragmentado que, perdendo suas crenças, perdeu sua unidade interior. É dever dos poetas de hoje falar de tudo que sobrou das ruínas - e está cego. Cego e torto e nutrido de cinzas(...)

BARROS,Manoel. “Sobreviver pela palavra”. In:Gramática expositiva do chão, p.308-309.

Esse vício de amar as coisas jogadas fora – eis  a minha competência. É por isso que eu sempre rogo pra Nossa Senhora da Minha Escuridão, que me perdoe por gostar dos desheróis. Amém. (p.331)

Um comentário:

Graça Pires disse...

Estou sempre a aprender com o nosso poeta Manoel de Barros.
Um beijo, minha querida Amiga.